14 de maio de 2006

A máquina*


Era um colorido revolucionário. Era tanto amor. Era ele lá naquela luz tão forte que passava acima do que a cabeça poderia alcançar. Era menos absurdo do que a imaginação. Era sonho tão legítimo. Era imperfeição absoluta e uma atmosfera muito menos sufocante. Era chão de terra batida e televisão de madeira. Era amarelo para espantar a morte. Cantarolar, cantarolar. Era um despertar de uma outra fábula. Mais próximo ainda. Tinha um algo de mágico no caminho sim. Tinha algo de ilusionismo que encantava. Desprovido de sectarismos e qualquer outro ‘ismo’ pela frente. Corria em direção a uma alquimia limitada, um atemporal suspiro aliviado e atento. Aquelas luzes mobilizadoras estavam a projetar aos olhos qualquer coisa de real que a imagem desmascarada poderia produzir. E, de repente, amor de um homem filho do tempo. Não era identificação, era deslumbramento. Era desejo de uma proximidade qualquer com aqueles poderes. Na vontade ininterrupta de ser amor. Aquelas cores me modificaram. Aquela menina que me pinta colorido precisava me ver naquele instante. Eu estava modificado. A luz entrava pelos olhos de forma a iluminar meus pensamentos tão tardios. De repente já não era tão paralisado. Tinha cor na medida certa. Nunca abusou e mesmo assim me chamou atenção demais. Eu que prefiro os olhos da abundância. Eu, neo-barroco, que não aprendi gostar de meio tons.

"
Hoje eu tenho apenas uma pedra no meu peito
Exijo respeito, não sou mais um sonhador
Chego a mudar de calçada
Quando aparece uma flor
E dou risada do grande amor
Mentira"**

Do amor que nunca se tem e que aparece nas mais falseadas ilusões e no movimento do inconsciente. Era aquilo que se via ali. Era uma fenomenologia marcante. Era um estudo de como as matizes mais fullgás fosse importante para o mundo. Era de um pieguismo e de uma abstração barata que me comovia a todo instante. As fórmulas eram feitas da forma a prender meus olhos. Ele estava ali na minha frente, Antônio. Ele estava me dizendo sempre do amor que nunca tive, mas que pelo visto é fundamental. Desde o momento que a chuva caiu para tomar lugar de suas lágrimas. Aliás, era eu quem estava a lacrimejar as imagens dele. Eu queria ser ele, amor.

"
Meu Deus, o que será que tem
Nesses olhos teus
O que será que tem
Pra me seduzir
Pra me escravizar
Não sei
E não saberei também
Como resistir
A seu modo amar"***

AO voltar de um mundo submerso na beleza dos sonhos, tão concretos quantos verbais. Volta-se a desempenhar um outro papel simbólico: Ser filho do tempo e buscar o mundo para trazer ao meu grande amor!

Texto em homenagem ao filme "A Máquina"
Foto :: Vânia Medeiros

*Filme de João Falcão
**Trecho da música Samba do grande amor de Chico Buarque
*** Trecho da musica Canção dos Olhos de Chico Buarque

2 comentários:

Diva Brito disse...

Eu li você hoje pra desanuviar, pra me acalmar, suas palavras me acalentam...
Li você hoje mesmo enfurecida com alguns contratempos...mas ler você me sugou uma grande parte de tudo que me pertubava.
Obrigada, ler você me faz bem!

Anônimo disse...

"Aquela gente encantada
que chegava e seguia...

Era disso que eu tinha medo: do que não ficava pra sempre."

f.