26 de fevereiro de 2009

Carnavália IV



Chovia na noite da quarta-feira nas ruas de Olinda. Chovia de duas formas, a primeira delas é das águas rolando nos paralelepípedos daquele lugar e a outra é das lágrimas de pierrots e columbinas, anjos e demônios, pessoas e pessoas que viveram toda a experiência com o corpo e as sensações durante os dias que se passaram. Chovia assim dubiamente por que não era uma quarta qualquer, acabou-se o carnaval. A chuva (e as lágrimas) lavavam o chão como se exorciza-se cada pedacinho de momento que produziram a magia da entrega e a vivacidade da leveza imagética nos rostos alheios.

Os sentimentos continuam perpassando mas, como era carnaval, era nítido que a liberdade de sentir estava pontuado como eixo central dos olhares. E então, se molhavam de água, se enxarcavam de perfume, se lambuzavam de lama. Aquelas ruas permitiam mais. Bem mais. Então, se vestiam com capas de super-heróis, se infiltravam nos contos de fada, eram personagens da caixinha mágica de luz, se protegiam com máscaras ornamentadas e outras tantas criatividades. No auge, quando se olhava pra trás, descendo ou subindo ladeiras, uma multidão de cores se formava. Energizava. Emocionava!

O outro te sorria sempre. Quando em coletivo se dava "olares/oiê/ahan", quando se passava de timbaleiro, quando a espuminha pairava pelo ar, quando a água era jogada sobre o corpo. E tudo ia acontecendo como se em um outro lugar do espaço/tempo, como se outra dimensão acercasse, como em outro mundo.

Por outras ruas alí por perto, em um lugar não tão mais antigo, outros sonhos de momo. Frevos e passinhos acompanhavam a decoração de desenhos de beleza e delicadeza, além de confetes e serpentinas. A sinceridade da rabeca rangia os acordes junto a notas suaves de guitarra; os tambores de Naná com a Luz de Tieta de Caetano; a verdade nos olhos de um moço lírico; o povo acompanhava madeira do rosarinho com mãos pro alto; e sambas em alto-astral.

Tinha também sucesso pra quem quisesse e água pra beber. Macaxeira com charque a rodo. Lugar inflável de deitar. Tinha desejos diferentes, corpos juntos todo tempo, corpo querendo descansar, também. Teve sempre Hino ao elefante, orquestra de rua, povo de beijo e troça de coveiro. E não acabava por aí, mas como diz a letra da canção: "É de fazer chorar/quando o dia amanhece/e obriga o frevo acabar/ó quarta-feira ingrata/chega tão depressa/só pra contrariar"*

Para o afago, as carícias e as alegrias das solidões juntas de quem esteve perto no carnaval. July [gatinha], Gina, Amandinha, Emanoel [bebê], Victor, Zé[Dinho], Pat e Ramon [com carinho todo especial pelo cuidado], Celis e Rafa [com prazer de estar junto], Miloca e Lari [e seus olhares carinhosos,] Diogo e Franklin. Também para o povo da Lhama! Radamés e família com sua hospedagem. E todos que foram achados, vistos e queridamentes tocados por esse olhar que se resume aqui.

* Trecho do frevo
Quarta-feira ingrata (é de fazer chorar) de Luiz Bandeira

5 comentários:

Zé Diego disse...

Lindo. Os caminhos se cruzaram com uma sinceridade, sintonia e espontaneidade de um sorriso escorrido de pastadagua pela chuva e pelos tiros soltos ao leo pelas ruas cambaleantes...

Unknown disse...

eita farraa!!!
liberdade ainda que tardia ;)

JL disse...

Ê vontade de ter feito parte desse coletivo...

Anônimo disse...

Perfeito. Obrigada por me mostrar novos caminhos.

Julyana Monte disse...

E a cada passagem lida, os olhos marejados pela saudade e pela distância. Obrigada por nos proporcionar essa relembrança, tão próxima e tão íntima dos lindos momentos por nós compartilhados. Que venham outros carnavais!