20 de agosto de 2013

Cartas a um jovem terapeuta (Parte I - sobre o sexo)



"Me ocorria que era uma divindade o corpo. Um universo de milagre entrelaçado pelo medo e pelo desejo. Porto estratégico de vontades, ele ditava as regras da consumição, da excitação. E enquanto tateava pela inexperiência, ocupava-me de saber se esse tal que eu possuía alertava outros pelo exalar sutil de convocações, pela sua forma moldada para olhos alheios ou pelo jeito que se deslocava no universo. Só assim, claro que também com as memórias e marcas dele (o corpo), poderia merecer o toque e o gozo. O pintava, o comia feito ruptura, alimentava ele de vícios e de vazios, além de saborosos afetos, claro. No meu caso e na maioria das vezes sempre o achava imperfeito. O problema foi acha-lo demasiado incapaz de atrair outro. E por isso muitas mudanças foram feitas. Sinapses reestruturadas, alegrias pré-moldadas, corretivos desenhados especialmente para tal coisa. E vamos testar. Levei-o a bailes para que mostrasse desenvoltura, levei a conversas que estimulasse a construção harmônica de posicionamentos com conexões bem encaixadas, argumentei por leve o levando pelas caixas de bits (algumas vezes iluminando-o para fios). Antes de dizer-lhe rechaçado, admito que o enchi de esperanças de que havia desejo puramente em descobrir-lhe. Posto que de experiências, notou-se sua incapacidade de interessar. E tudo que lhe houve de toque até aqui resulta em ansiedades e vontades desproporcionais. Acometeu-se de uma vergonha assustadoramente prazerosa e não me libera sem restrições pra agendar novas tentativas. Melhor que não as tenha!"

Nenhum comentário: