19 de agosto de 2013

Sold out



Comprei duas doses de tédio no supermercado vizinho à minha casa. Desdenhei algumas vezes da minha condição de procrastinador, relutando contra a preguiça de mudar minha postura sobre mim mesmo. Afinal, para eu descobrir se algo tinha saído do lugar no mundo lá fora, no mínimo tomaria um banho, escolheria uma roupa apresentável, me veria melhor. Tudo isso às custas de uma visível revolução que nesse momento se chamava deixar pra lá as cobertas que me protegiam do frio e a cama que me davam prazer em me ajudar a reclamar de mim com sabedoria de mestre. Pois então, decidi comprar uns quilos de alegria e até mesmo quem sabe uns tortos litros de desejo.

O que faltava de libido, ardia de uma esperança fatídica de que eu não mais soubesse os caminhos de fazer tudo da mesma forma como fazia anteriormente. Até busquei promoção que me animasse. Até pesquisei texturas, sabores como projeção e impulsionador. Tava decidido! Abriria aquelas portas para sentir de perto aquela alegria que eu levaria ao caixa orgulhoso. Num súbito pensamento grotesco afirmei pra mim que o preço que pagaria pela peça adquirida seria muito maior que a do arrependimento do gosto não absorvido. Era notório que me perdia na escolha, mas eu andaria alí sem me proteger.

Desci ofegante as escadas para não topar com outro possível comprador nos elevadores. Tudo enlatado, talvez. Eu mesmo nunca deixei de ser. E depois, prateleira por prateleira fui seduzido mais uma vez por caras sensações de conforto sem desfaçatez. Comprarei, pensei. O risco nem era tão grande assim. Ao que pese o rótulo que eu mesmo produzi, tinha mais uma vez consumido um punhado de ilusão aparente sem prazo de validade a vencer. 

No final, se existe um desses pra vender, quem não valia nem um centavo era eu. Que aliás nem teria comprador. 

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