14 de março de 2012

Carta a um futuro amor



Caro, boa noite!


Esta carta está datada por isso mesmo, porque me apareces à noite com um ar de cansaço do dia. Aparece calmo e sem cerimônias para acalmar os ânimos de um abrupto e acelerado pensamento de adivinhação. Tudo parece uma aberração de tão severo, gritante, mas nada seria mais torturante para um olhar ingênuo do que rumores de um amor a porvir. Então, apareces em palavras como poesia concreta, reta, sem muitas acentuações e os pontos pingados de desenho no papel de luz.

Aproveitando a porta aberta, não lhe pedi licença de propósito. Quero que meu amor guardado em parcimônia na espera de outrem seja digno de ser seu em compasso. Rastro decifrável de emoção quando você rir dessa parte da carta com o pensamento: "que loucura tanta vontade". Eu também estou rindo aqui, para dizer que não há intenção do autor. 

Isso mesmo, não há vontade de que sejam recíprocas essas palavras, há vontade de emoção. Mas sei que nem isso se pode desejar. Qualquer que seja o susto, está valendo. 

Argumentei dois ou três coisas sobre o cotidiano para chamar atenção, naquela intenção avassaladora de que a reação fossem signos de cuidado. Aquele prazer do mistério das palavras, aquele talvez ouvir o que ensaiou como resposta na frente do espelho. E riu mais uma vez de tal inconveniência. Ah! Nem está parecendo uma carta de amor com tantos desconfortos, mas não poderia ser de outra forma se não a tocar na obscuridade do desejo alheio para você mesmo.

É por isso que as ideias continuarão entrecortadas por parágrafos tortos. Até porque a carta de amor não vai servir para amor nenhum. Ao contrário, deve servir para o tempo dizer que quando éramos jovens tínhamos uma mania antiga de escrever palavras para convocar nossas vontades de estar junto para mais perto. Um querer aliviado, até mesmo inconfessável, de você e eu. 

E então, muito boa noite, meu caro. Meu caro tempo. Que me ame no futuro, como a você, homem!

Foto: Tiago Lima

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